Sol, ar puro. A paisagem mais linda da cidade e uma corridinha antes de ir ao trabalho. No vai e vem dos passos, das corridas daqueles que se cruzam tudo parece perfeito, tranquilo. Mas as aparências enganam. O analista de sistemas Denis Suguieda corre como complemento do seu equilíbrio.
“Eu me considero uma pessoa bem calma, não tento ficar nervoso por nada, acho que não leva a nada ficar ansioso ou nervoso”, afirma.
Não é o caso da enfermeira Caroline Coelho. Ela corre contra suas inquietações: “Trabalho, dia a dia, correria, deixa a gente um pouco mais estressada, um pouco mais ansiosa”.
A Carol faz parte daquele grupo de pessoas que todos nós conhecemos. Pessoas que não param, que se preocupam, que tem uma expectativa exagerada, que parecem sempre angustiadas. Carol é ansiosa! Um problema que atinge mais as mulheres do que os homens. E ela só se deu conta quando começou a esquecer coisas demais.
“Você tem que dar recado a algum paciente, você tem que dar recado pra equipe. Você acaba esquecendo coisas do dia a dia”, diz.
Coisas que não acontecem com o Denis, o analista de sistemas que não reclama da memória.
“Muito difícil esquecer. Minha memória tem sido muito útil pra mim”, afirma.
O Centro Internacional de Neurociência de um hospital de Brasília revelou que existem muito mais ligações entre memória e ansiedade do que a gente possa imaginar ou perceber. E isso pode fazer muita diferença no dia a dia.
Tudo começou quando os médicos notaram que cada vez mais adultos jovens vinham se queixar de problemas de memória e atenção. Eles decidiram investigar. Carol e Denis fizeram parte do grupo de pessoas que foram estudadas. A enfermeira e o analista de sistemas são funcionários do hospital.
Foram vários testes. O mais revelador é um em que eles ouvem uma história e depois contam o que lembram. Tudo dentro do aparelho de ressonância magnética que vai registrando a atividade cerebral.
“A ansiedade realmente provoca um tumulto no cérebro. Bota o cérebro bombardeando para tudo quando é lado a um custo muito alto”, afirma a neurocientista da Rede Sarah, Lucia Willadino Braga.
Uma evidência comprovada pelas ressonâncias magnéticas que fazem uma espécie de fotografia da ansiedade e da calma.
“No caso do cérebro do Denis, a gente vê aqui uma ativação mais focada. Com o cérebro de uma pessoa ansiosa, no mesmo corte, você vê que ela usa a área que é necessária, mas ela usa toda uma ativação, ela recruta, faz um esforço muito grande para recrutar os neurônios. No final do dia ela está muito mais cansada, porque ela fez uma força muito grande pra poder desempenhar as tarefas da vida diária cotidiana”, explica Lucia Willadino Braga.
A nossa memória começa a dar sinais de que já não é mais a mesma lá pelos 40 anos quando durante uma conversa, um bate papo, por exemplo, a gente não consegue lembrar o nome de uma música, de um filme, de um escritor. E aí começa aquela história: aquele escritor brasileiro, casado com uma brasileira também, como é que é mesmo o nome dele? E não tem jeito, o Jorge Amado não vem à nossa cabeça.
São muitas as razões para a nossa falta de memória. O que podemos fazer é exercitar. Inclusive resgatando velhos hábitos.
“Primeiro: aprender. Aprender qualquer coisa. Aprender coisas novas faz novas redes neuronais no cérebro. Exercita um número muito grande de neurônios. Ler. Na hora de calcular não usar a maquininha, usar o cérebro. Fazer contas de cabeça! E também não ficar tão dependente do tablet para memória e do celular, porque de repente hoje tudo se registra ali, então não precisa usar a memória pra isso”, destaca Lucia Willadino Braga.
Agora se você se acha parecido com a Carol, não precisa ficar ansioso. “Tratando a ansiedade, melhora a memória”, garante Lucia.
É o que Carol está fazendo. Consciente do problema, procura relaxar, mas no trabalho, se cerca de muitos cuidados.
“Eu tenho muito cuidado com minha atuação. Qualquer erro, qualquer esquecimento você pode ter um impacto muito forte na vida de qualquer paciente, então não pode esquecer de nada”, diz Carol.
Se a ansiedade é um veneno para a memória, a meditação é um santo remédio. Estudos revelam que, se a gente conseguir sair do corre-corre por alguns minutos por dia, conseguiremos realizar nossas tarefas em menos tempo e gastando menos energia. Cérebro descansado é cérebro econômico é mais eficiente. E uma coisa puxa outra: a vida fica menos estressante.
Vera que o diga! O cotidiano dela não é moleza. Junto com o marido Vanderlei e os filhos, ela passa o dia na metalúrgica da família. E o horário é bem puxado.
“Saímos às 8h de casa e retornamos às 22h”, conta Vera Paixão, empresária.
Foi quando passou por um momento bem difícil na vida que vera decidiu praticar o yoga. Na busca pelo equilíbrio a meditação surgiu naturalmente.
Hoje, para ela e para um grupo, qualquer hora é hora. Não importa o lugar! Meditar é preciso.
“Tinha uma vida muito agitada, muito cansativa e a meditação serviu como uma base para eu cultivar um pouco mais de equilíbrio emocional e mental na minha vida”, conta a farmacêutica Jeanne Pilli.
“A qualidade do sono, mudou muito, eu percebi que quando eu fazia meditações prolongadas, a qualidade do sono era muito boa e o bom humor, a qualidade do humor, o bem estar”, lembra Anderson Pires, professor de yoga.
“Quando eu estou cansado, eu uso as práticas de meditação pra dar uma esvaziada no cérebro. Sempre que eu posso, sempre que eu sinto necessidade e a minha prática é realmente diária”, conta Marcelo Csermak, empresário.
“A maioria das pessoas fica ao mesmo tempo com uma tagarelice mental, sempre pensando em coisas que não fez ou deixou de fazer ou coisas que tem por fazer. Prazos, uma porção de coisas. Quando você para, você começa a vivenciar, porque a única coisa que a gente tem de verdade é o presente, é o momento presente”, diz Tereza Maria dos Santos, terapeuta ocupacional.
“Essas pausas são a oportunidade do corpo relaxar, da sua mente ficar mais atenta, mais clara e aí você está pronto para retomar o seu trabalho, a sua atividade de uma maneira mais serena, mais centrada, então isso faz toda a diferença”, afirma Elisa Kozasa, doutora em psicobiologia.
Intrigada com os benefícios da meditação, a bióloga Elisa Kozasa, doutora em psicobiologia, decidiu investigar o cérebro das pessoas que meditam. Para isso, reuniu um grupo de 20 voluntários que praticam meditação há pelo menos três anos, no mínimo três vezes por semana. E comparou com 19 pessoas que não meditam.
“Quem não medita precisaria estar ativando mais essas áreas do que as pessoas que meditam regularmente, o que pode significar que as pessoas que meditam teriam um cérebro mais eficiente, elas precisam recrutar menos áreas cerebrais do que as pessoas que não meditam”, explica Elisa.
Para realizar o estudo, que foi feito em colaboração com instituições internacionais, os voluntários passaram por testes durante as ressonâncias magnéticas. E ficou claro que as que meditam usam menos o cérebro para as mesmas funções.
“Provavelmente elas são mais focadas, conseguem manter a concentração na tarefa e provavelmente elas não se distraem tanto. De uma maneira mais simples, a gente pode dizer que seria como se ela estivesse economizando, seria uma economia do cérebro”, revela Elisa.
E por que economizar o cérebro? Para os especialistas, vivemos hoje num tempo em que nossa atenção é exigida de todos os lados. Trabalho, casa, família, trânsito, telefone, computador. Quanto estímulo!
“Antes eu era uma pessoa muito dispersa. Eu não conseguia focar em nada. Depois da meditação eu comecei a aprender a acalmar a mente e me focar, você sabe que depois que esvazia a mente a gente fica cheia de sabedoria”, afirma Vera Paixão.
Hoje, Vera acorda bem cedo para antes mesmo de sair de casa, meditar de 15 minutos a meia hora.
“Acreditem, os pássaros vêm cantar para mim. E vêm vários. Minha alma fica muito feliz quando eles chegam. E é recíproco”, diz Vera.
Foto: Globo Repórter